2.3.08

doze palavras

Racismo. Cerca de cento e trinta anos depois de Alexis de Tocqueville denunciar em ‘De la Démocratie en Amérique’ os costumes e mentalidades em terras americanas, nomeadamente no que toca ao conflito de raças, Susan Sontag respondia ao ponto 4 de um questionário —Is white America committed to granting equality to the American Negro?— que lhe parecia claramente que não. Que uma minoria apenas, de americanos cultos e educados, sim, estaria disposta. (‘Styles of a Radical Will’, edições Picador, 1966, pag198). Entre estas duas observações, de Tocqueville a Sontag, aconteceram diversos momentos históricos e significativos na luta dos Direitos Humanos e da igualdade racial na América: por um lado a Guerra Civil, prevista por Tocqueville vinte e cinco anos antes, cujo objectivo visava (e cumpriu) o Abolicionismo global; e por outro o African-American Civil Rights Movement (1955-1968) com o qual se alcançou o célebre 'Civil Rights Act' de 1964, que proibia oficialmente a segregação e a descriminação racial. Hoje, apesar de tudo, o racismo continua numa grande percentagem dos norte-americanos; independentemente da sua raça: seja branca, preta, amarela ou castanha. Como escreveu Sontag no mesmo artigo, 'a América é um país apaixonadamente racista e que continuará a sê-lo num futuro previsível'. Quarenta anos depois, não se enganou.

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Bukowski. Quando um homem não acredita em nada, nada tem a perder. Assim entendeu Mr. Bukowski a vida e a sociedade. Escreveu sempre sobre o que viveu: mulheres da noite e noites de whisky, apostas de cavalos e empregos de merda. Tudo fugaz, nada sério; tudo sério. Do seu alter-ego Henry Chinaski escreveu que foi o homem que nunca teve o emprego que quis e que nunca manteve o emprego que tinha. Aos 49 anos, depois de aceitarem para publicação um dos seus contos, passou a escrever a tempo inteiro. Ele mesmo disse que nessa altura tinha apenas duas opções: continuar o seu emprego nos Correios e endoidecer ou assumir-se como escritor e passar fome. Escolheu passar fome. Morreu aos 74 anos. Na sua campa está escrito 'Don't try'.

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Noir. O género que a América criou suportada pelo êxodo do intelecto europeu e cujo termo foi cunhado pelo francês Frank Nino. O noir explora o lado obscuro da condição humana: as fragilidades de carácter, a descrença na moralidade social, a (des)lealdade nas relações pessoais. Está no cinema, na pulp-fiction e alguns até elevaram o género a Literatura. Os heróis são vilões e os vilões são heróis, com os quais se simpatiza sempre mesmo sabendo que legalmente estão do outro lado. Os que se opõem a eles são obrigatoriamente os condenáveis, mesmo que estejam do lado certo. O noir movimenta-se nesta perversidade, nesta divisão moral. E ensina sempre uma lição: o crime não compensa.

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Não são doze, são apenas três, nem tão-pouco são as 'favoritas'. Mas mesmo assim acho que servem.
Roll the dice.