28.8.08

das questões culturais

No teatro de Harold Pinter há genericamente uma sombra do passado —'Old Times', 'Kind of Alaska' ou 'Ashes to Ashes' são disso exemplo entre outros— no qual as tensões do momento, (por vezes o ciúme ou a obsessão), advêm de actos muito anteriores na escala temporal. O presente serve sobretudo de palco de confrontação, mais ou menos violento, de essas antigas acções —mais físicas do que emocionais— e na capacidade dos seus protagonistas as ultrapassarem; ou tentarem, pelo menos, pois como já dizia o Durrell não é o amor que é cego, mas o ciúme. Nesses ditos confrontos, com diálogos pausados, repetitivos e elípticos (maioritariamente) entre homem e mulher, entram em jogo elementos fundamentais do teatro de Pinter: a influência da subjectividade da memória e o desconhecimento do outro; carácter & passado.

**

Observadas com o devido distanciamento, as personagens de Pinter só poderiam mesmo ser anglo-saxónicas. As reacções frias e controladas a determinadas confissões ou inesperados insultos são típicas da austeridade britânica. Num Pinter à portuguesa ou à italiana nunca poderiam existir pausas ou repetições. Existiriam, isso sim, estaladas, mulheres aos gritos e com as garras de fora e homens a sair porta fora aos pontapés aos gatos delas. Levar um par de cornos pode calhar a todos, mas ser «cornudo», que para além de ser um estado de espírito ou uma predisposição moral, é também uma questão cultural.