24.11.08

arthur miller's all my sons

Na leitura de 'All My Sons' (1947), de Arthur Miller, sobressai o confronto entre o dever moral e a cobardia na negação das responsabilidades pessoais perante a sociedade. Nesta paralela crítica à fragilidade do american dream e ao oportunismo do lucro em tempos de guerra, Miller faz também um retrato da família norte-americana no contexto social pós-conflito, expondo as consequentes fragmentações emocionais de diversos ângulos. A acção decorre em menos de vinte e quatro horas, herança da tragédia grega que Molière já recuperara no século XVIII, mas os elementos fundamentais para a base da narrativa estão dispersos no passado. O momento da acção descobre uma culpa adormecida que na realidade se torna num veículo que transporta para palco outras questões universais: o vazio da morte, as deficiências de carácter, a hipocrisia da sociedade.

Pela crescente carga dramática desta peça, que apesar de tudo começa num registo leve e cordial, foi com algum preconceito que me arrastei ao Schoenfeld Theatre. A localização do teatro e o elenco super-star pareciam antever que 'All My Sons' —embora Miller a tenha escrito numa última tentativa de sucesso comercial— não passaria de uma manobra-de-diversão. Foi um preconceito injustificado, (ou vencido, como em Marivaux) pois acabei por achar que esta adaptação do encenador britânico anti-naturalista Simon McBurney se revelou justa ao teatro naturalista de Miller. E se esta adaptação foi fiel aos diálogos e à ideia de espaços e tempos verbais, alguns movimentos, comparando com a impressão que tive aquando da leitura do original de Miller, resultaram desnecessariamente forçados e despropositadamente histriónicos. Por seu lado, o contraste entre a cenografia minimalista de Tom Pye, seu colaborador na Complicite, e o cenário realista minuciosamente descrito por Miller no Primeiro Acto acentuava a adaptação contemporânea de McBurney. Quanto aos actores, percebiam-se claramente as diferenças de método entre a escola do Teatro e a do Cinema, entre John Lithgow e Patrick Wilson, entre as posturas mais rígida e propositadamente artificial e a mais dinâmica e real. Talvez por esta componente, juntamente com os efeitos vídeo/som, esta peça tenha surtido um efeito algo cinematográfico. O que não é mau de todo.