15.12.08

a midnight valium for a good night's sleep

Não te esqueças do que te disse. De como foi com as suas personagens e cenários que a geografia nocturna da cidade que nunca dorme começou a enraizar-se no meu imaginário. Tinha por aquela altura uns doze anos; só depois apareceu o cinema como referência de fantasias malditas. Ninguém o conhecia, lembras-te de comentar-te num táxi pela Madison? excepto guardas-nocturnos em edifícios desertos e amantes da literatura policial com a idade dos nossos pais. A pulp-fiction ainda não era culto, era apenas uma consequência do vazio do pós-guerra já algo esquecida na revolução da pós-modernidade. Anos antes de tudo isto já lhe chamavam mercenário na América; apontavam-lhe o dedo por escrever por dinheiro. Não era novidade, ele sempre o admitiu e esfregava na cara dos críticos as suas estatísticas de best-sellers suportados pelos mecânicos, operários fabris e donas-de-casa do all american dream.

Foi um tipo mau, mas não tão mau como os piores dos seus livrinhos de pasta de papel; andou por um circo, foi piloto de paz em tempos de guerra, tornou-se brevemente um actor medíocre de si mesmo e bebeu mais whisky que dois homens de barba rija juntos. Às mulheres chamava dolls e à sua personagem melhor do que todas as outras chamou Tiger Mann, o amoral tigre solitário nas ruas frias e cinzentas de Nova Iorque. Foi com ele que tudo começou. Nas páginas da Colecção de Bolso da Vampiro há vinte anos atrás.

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Por isso, agora diz-me: que mais há a fazer? Entre ti que cresceste com Enid Blyton e mim que cresci com Mickey Spillane?