17.4.09

da verdadeira essência

'Bellissima' (1951), terceira longa-metragem de Luchino Visconti, é amplamente inserida no Neo-realismo Italiano. De facto, não há dúvidas de que a sua realização se insere no período final da identidade neo-realista mas, à partida, esta obra de Visconti diverge da corrente pelo carácter satírico e humorístico. O neo-realismo habituou-nos a um estilo documental que expõe cruamente a realidade social do pós-guerra. Fá-lo em diversos planos, que vão da denúncia da miséria à reconstrução/transformação física da cidade, e onde a carga dramática é (quase) sempre directa e despojada de artifícios. Em 'Bellissima' também se encontram elementos do neo-realismo, vero, contudo existe paralelamente um filtro atenuante dado pelo tom de comédia que a separa do estilo purista e documental. No entanto este tom, vamos compreendendo no desenvolvimento, alivia uma intensidade melodramática. Entre risos, Visconti apresenta-nos um mundo grotesco.

Mark Shiel, no seu 'Italian Neorealism, Rebuilding a Cinematic City', reconhece em 'Bellissima' (pag. 93) marcas do neo-realismo, embora o seu registo de light-hearted comedy (palavras suas) a afaste da obra (anterior) geralmente politizada de Visconti. Por conseguinte, pode subentender-se, será menos relevante para a identidade da corrente. Inicialmente tive a mesma impressão que Shiel. Porém, no desenrolar do filme, o realismo das discussões reles e grosseiras e das suas personagens fez-me mudar de opinião. O suficiente para dizer agora que estar privado de 'Bellissima' significa estar privado, num contexto vernáculo e humanista, da verdadeira essência do neo-realismo italiano.