1.10.10

num julho não tão remoto

Passam já das duas da tarde. Movo-me lentamente para apanhar o maço de cigarros do chão ao lado da cama. A ventoinha parece imóvel, no entanto sei que tenta cumprir a sua função. Gentil como um parente de visita, o som do continuado movimento das pás vai-o comprovando. Por esta altura devem estar 99 Fahrenheit lá fora. Cá dentro um pouco menos, ou nem por isso. O meu corpo ensopado reflecte a chama brilhante do fosforo. Deixo-me ficar assim, até que o fumo me desperte do torpor. O alvoroço no corredor acalmou há horas, no momento em que os emigrantes chineses saíram para os seus turnos de vidas de merda ao longo da Bowery Ave. Vejo-os quando chego de madrugada, espalhados em camas metálicas por todos os cantos, enrolados sobre si mesmos indiferentes ao calor que se faz sentir. O frio deles é outro, de pavor e desconhecimento. Para isso, não há nada que os aqueça.