22.12.10

our gang of two

«Such is the whirl of the city, so great its centrifugal force, that it would take superhuman strength to envisage living as a couple and sharing someone else's life in New York. Only tribes, gangs, mafia families, secret societies, and perverse communities can survive, not couples. This is the anti-Ark. In the first Ark, the animals came in two by two to save the species from the great flood. Here in this fabulous Ark, each one comes in alone — it's up to him or her each evening to find the survivors for the last party».

Em 'America' (1986, Edições Verso London-New York 1988/2010), Jean Baudrillard elabora uma sequência de reflexões sobre viagens pelos EUA. É, em parte, um livro de período, zeitgeistiano, mas paralelamente intemporal. Das suas observações, nenhuma me toca de forma tão particular como a acima transcrita do capítulo 'New York'. A alusão ao episódio bíblico da Arca de Noé como a antítese à desagregação do casal contemporâneo indicia o desapontamento característico do pós-modernismo. Baudrillard, ofuscado pela profusão e velocidade dos corpos na densidade da paisagem urbana, onde milhares de pessoas parecem «não ter outro propósito do que produzir o cenário permanente da cidade», não consegue encontrar uma outra Nova Iorque. Na sua leitura, o francês enuncia o movimento visceral, fruto de uma força centrífuga, a par e passo com uma solidão sem limites. É esse mesmo sentimento de solidão e distanciamento social que o leva a elaborar a tese de que apenas seres unidos por algo maior que um parco interesse comum podem sobreviver. Os solitários também por lá andam, na luta nocturna sem rumo, à deriva. Condenados.

Nós sobreviveremos.
No nosso gangue de dois.