repent yourselves, 2010
Em 'Atlas', iniciado em 1964 e em contínuo desenvolvimento, Gerhard Richter começou uma colecção a partir de fotografias retiradas de álbuns de família, de recortes de publicações e de postais. Poderíamos vê-la como uma interpretação da Biblioteca de Babel, de Borges, mas para a Imagem ao invés da grafia: um Arquivo Universal. Nesse arquivo encontramos imagens amadoras e familiares, jornalísticas e profissionais, de paz, de guerra, de autor, retratos, desenhos, textos e anotações manuscritas. Erotismo, pornografia, violência, demência, ingenuidade, apatia, infância, êxtase, quase tudo está representado neste conjunto de cerca de 5000 imagens e ele revela-se em parte como uma testemunha histórica — dos costumes, das ideias e das emoções — dos séculos XIX e XX.
Numa tentativa de marcar uma linha cronológica e descritiva (através de imagens) que também operasse como uma «testemunha histórica», procurei pelos alfarrabistas e lojas de velharias norte-americanos fotografias de álbuns familiares que correspondessem a um período muito específico dos EUA: da entronização do American Dream à queda deste; ou seja, inícios de 1950 a finais de 1970. A selecção de imagens unicamente de carácter amador deriva da particularidade de encontrar nelas uma estética muito reveladora do período. Estas fotografias, conhecidas como kodak snapshots, resultam descomprometidas e casuais e surgem assim como as melhores testemunhas de uma identidade suburbana e colectiva. Nascem, paralelamente, de uma desculpabilização do sujeito perante o objecto.
Ao catalogar uma época através de imagens amadoras, quis igualmente acrescentar-lhes elementos que, por um lado, enfatizassem as raízes de uma identidade colectiva e que, por outro, questionassem a evolução dessa mesma «identidade». A incorporação de passagens bíblicas que focam o arrependimento e a entrega, (retiradas da versão Protestante da Bíblia), aos elementos fotográficos vem precisamente nesse sentido. É uma referência ao legado Puritano norte-americano que se regula por um ascetismo visual e emocional dentro da sua lógica de contenção física e espiritual: todos somos pecadores devido ao Pecado Original, nada mais nos resta do que o arrependimento.
«Repent Yourselves» explora assim o confronto dessa liberdade e individualidade do Sonho Americano —a celebração, o ócio, o lazer, o hiper-consumo, a padronização do life-style— com os dogmas de conduta puritanos da expiação da culpa pelo arrependimento enraizados no subconsciente colectivo de uma sociedade e cultura. Se as fotografias familiares e desinibidas sugerem a desculpabilização, as referências biblícas reforçam o seu oposto.
Numa tentativa de marcar uma linha cronológica e descritiva (através de imagens) que também operasse como uma «testemunha histórica», procurei pelos alfarrabistas e lojas de velharias norte-americanos fotografias de álbuns familiares que correspondessem a um período muito específico dos EUA: da entronização do American Dream à queda deste; ou seja, inícios de 1950 a finais de 1970. A selecção de imagens unicamente de carácter amador deriva da particularidade de encontrar nelas uma estética muito reveladora do período. Estas fotografias, conhecidas como kodak snapshots, resultam descomprometidas e casuais e surgem assim como as melhores testemunhas de uma identidade suburbana e colectiva. Nascem, paralelamente, de uma desculpabilização do sujeito perante o objecto.
Ao catalogar uma época através de imagens amadoras, quis igualmente acrescentar-lhes elementos que, por um lado, enfatizassem as raízes de uma identidade colectiva e que, por outro, questionassem a evolução dessa mesma «identidade». A incorporação de passagens bíblicas que focam o arrependimento e a entrega, (retiradas da versão Protestante da Bíblia), aos elementos fotográficos vem precisamente nesse sentido. É uma referência ao legado Puritano norte-americano que se regula por um ascetismo visual e emocional dentro da sua lógica de contenção física e espiritual: todos somos pecadores devido ao Pecado Original, nada mais nos resta do que o arrependimento.
«Repent Yourselves» explora assim o confronto dessa liberdade e individualidade do Sonho Americano —a celebração, o ócio, o lazer, o hiper-consumo, a padronização do life-style— com os dogmas de conduta puritanos da expiação da culpa pelo arrependimento enraizados no subconsciente colectivo de uma sociedade e cultura. Se as fotografias familiares e desinibidas sugerem a desculpabilização, as referências biblícas reforçam o seu oposto.
Imagens:
'Repent Yourselves', 2010, Pedro Duarte Bento
'Repent Yourselves', 2010, Pedro Duarte Bento
12 original Kodak snapshots with biblical inscriptions wooden framed, ed. 1/1
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