nyc 10989, magnum photos
Folheio com calma o livro, 'New Yorkers as seen by Magnum Photographers', que tinha há algum tempo na lista de espera das leituras em atraso. Seguindo o conceito de Barthes, o meu punctum dá-se ao chegar à pagina oitenta e tal; mesmo depois de atravessar séries de imagens que remontam à minha memória quotidiana da cidade que nunca dorme; por Alex Webb no Financial District, onde trabalhei, à cena de estalada entre dois homens na linha L, a mesma que usei diariamente a caminho de casa em Williamsburg, por Elliott Erwitt. Olhei a fotografia surpreso, desconhecia-a. É uma imagem simples, despretensiosa, urbana e tranquila. Tem por título 'a newly arrived immigrant eats noodles on a fire escape'. Ela é isso, de facto, mas é para mim muito mais do que isso.
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Podemos dividir o campo visual em dois planos distintos. À esquerda revela-se uma rua movimentada, numa cota inferior, e o facto de ter mais trânsito em direcção a sul demonstra que a hora do dia será talvez pouco depois das cinco da tarde, altura em que o fluxo para Brooklyn —a Manhattan Bridge está a um quarteirão— começa a aumentar. Não há sol nem sombras. As fachadas, de cinco a seis pisos, estão decoradas com reclamos de ourivesarias e de diamantes. No plano direito da fotografia está um homem asiático sentado num degrau de umas escadas de incêndio, no patamar exterior do terceiro para o quarto andar. Está apenas de cuecas e chinelos, de pernas cruzadas. Com a mão esquerda segura uma taça da qual sorve distraidamente, com a direita os chopsticks e parece ignorar o fotógrafo à sua frente, demonstrando uma certa intimidade.
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É esta a pensão, a minha lodge de Chinatown. Aquela em que por aqueles dias (no final da primeira estadia) chamei neste blogue de Os dias do China Hotel e na qual fiquei por mais de um mês, alternando períodos de seis, sete noites num cubículo do quarto andar com outras passadas noutros sítios. Foi aqui que estive mais só do que nunca e do que em qualquer outro lugar. E foi também aqui que de alguma forma me reequilibrei, recompus e preparei o regresso à normalidade, com apenas a companhia de cigarros american blend como conselheiros nocturnos. Exactamente nas escadas-de-incêndio desta foto, onde se vê um emigrante recém-chegado a comer uma sopa de massa chinesa no ano de 1998, uma década antes de mim. Não há engano possível.
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Podemos dividir o campo visual em dois planos distintos. À esquerda revela-se uma rua movimentada, numa cota inferior, e o facto de ter mais trânsito em direcção a sul demonstra que a hora do dia será talvez pouco depois das cinco da tarde, altura em que o fluxo para Brooklyn —a Manhattan Bridge está a um quarteirão— começa a aumentar. Não há sol nem sombras. As fachadas, de cinco a seis pisos, estão decoradas com reclamos de ourivesarias e de diamantes. No plano direito da fotografia está um homem asiático sentado num degrau de umas escadas de incêndio, no patamar exterior do terceiro para o quarto andar. Está apenas de cuecas e chinelos, de pernas cruzadas. Com a mão esquerda segura uma taça da qual sorve distraidamente, com a direita os chopsticks e parece ignorar o fotógrafo à sua frente, demonstrando uma certa intimidade.
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É esta a pensão, a minha lodge de Chinatown. Aquela em que por aqueles dias (no final da primeira estadia) chamei neste blogue de Os dias do China Hotel e na qual fiquei por mais de um mês, alternando períodos de seis, sete noites num cubículo do quarto andar com outras passadas noutros sítios. Foi aqui que estive mais só do que nunca e do que em qualquer outro lugar. E foi também aqui que de alguma forma me reequilibrei, recompus e preparei o regresso à normalidade, com apenas a companhia de cigarros american blend como conselheiros nocturnos. Exactamente nas escadas-de-incêndio desta foto, onde se vê um emigrante recém-chegado a comer uma sopa de massa chinesa no ano de 1998, uma década antes de mim. Não há engano possível.
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