30.6.10

em prol da verdade

Emma Bovary, desgraçada, nem era má.
O marido é que, pobrezinho, era péssimo.

27.6.10

Flaubert, la putain

«Madame Bovary, c'est moi».

26.6.10

guia licencioso



Para a vida, negócios, sociedade e cama.
Pour les femmes (mal) mariées.

bovary: masculin, féminin

O francês Flaubert, com o seu primeiro romance publicado, teve a prodigiosa capacidade de transformar um apelido em dois adjectivos distintos. Consoante o género, «bovary» será sinónimo de «cornudo», no masculino, e de «infiel», no feminino. Quase antagónicos —no método— mas nunca indissociáveis —na carne. Para haver um, há outro. Os dois são apenas um.

le mot juste

Flaubert. Não por interesse mas sim por afinidade.

25.6.10

bonheur

Esse delico-doce conceito inventado por uma burguesia aborrecida, ansiosa por romantismo e ainda maiores necessidades de poder, a quem, no fundo, não lhe interessava tanto ser feliz como a notoriedade de parecer feliz. Do Iluminismo, se há coisa que perdurou, foram as aparências.

10.6.10

the similarities of our hells (3)

Bruno Ganz em 'Dans la Ville Blanche' (1986), de Alain Tanner

Sentia-se a apatia dos dias que se repetiam embrulhados em melancolia. Regras, tarefas, horários, aspirações, tudo isso se esquecera e parecia naquele momento fazer parte de uma nebulosa de outros tempos, de outros carnavais. Talvez fossem inocentes — sem dúvida que o eram — mas de certeza disponíveis. Para os outros; para mim. Depois a tomada de consciência, o peso das coisas, o golpe da vida. Reequaciona-se, repondera-se, talvez até se fuja, dirão alguns em última análise. Como se Ordem & Caos baralhassem e voltassem a dar. Sem saber o quê ou de quê, espera-se. Age-se não agindo, faz-se não fazendo, segue-se não seguindo. A inércia como o mote, ou quem sabe apenas uma vontade crua e instintiva disfarçada de derrota e desilusão que supere tudo o resto. Uma pausa na vida não é mais do que um ulterior e nuclear desejo de recomeço. É neste ponto de tangência que reconheço no marinheiro da 'Cidade Branca' de Alain Tanner um homem universal. Intemporal, desagregado, apátrida e nómada. Perdido. As semelhanças dos nossos infernos? Nada poderia vir mais a propósito. Ele, sei-o, fui eu num tempo não muito distante. Num tempo em que também deixei o meu cargueiro zarpar ficando assim por terra a ver navios. De copo de whisky na mão, por entre a fresta de uma janela.

8.6.10

the similarities of our hells (2)

Sempre procurei um bom efeito mas nunca obtive mais do que um mau resultado. Como um erro de paralaxe, admitamos. «Da minha própria vida», disse eu; «até ao dia», acrescentaste tu.

the similarities of our hells

Ao ler Céline, pus-me a pensar se o Bukowski o lera ou não, mas se não, devia tê-lo feito. Depois vasculhei umas coisas e na página 259 de 'Betting on the Muse' encontrei:

1) a resposta: this is high praise / indeed / and I know what / they mean: / my nerve to go / on was helped / by reading / Fante, Dostoevsky, / Lawrence, Celine, Hamsun / and others.

2) o porquê: the word / raw on the page, / the similarities / of our hells, / when it all comes / through with / special / force, / those words and / what they speak / of do help / get our asses / through the / fire.

e 3) a conclusão: a good book / can make an almost / impossible / existence, / liveable / for the reader / and / the writer.

4.6.10

a lot

A lot of issues. And a lot of vicious.