Não foram precisos mais de cinco minutos para perceber que a versão de 'Mãe Coragem' de Bertold Brecht —em Lisboa no CCB numa encenação
livre de João Garcia Miguel—, parece ser uma
afilhada estética e
contemporânea da tal do National Theater em Londres na qual saí antes do final há ano e meio atrás. No entanto, algumas diferenças fundamentais de salientar. Entre elas uma especificidade da adaptação do original que produziu uma considerável economia de meios humanos: a supressão de personagens. No meu exemplar de 'Mother Courage', (pela Grove Press, NYC, 1961), conto trinta e duas. Na adaptação presente no CCB, são cinco actores para cerca de quinze. Neste
tour-de-force, apenas Custódia Gallego (Mãe Coragem) e Sara Ribeiro (a sua filha Muda) se mantêm constantes nos seus papéis ao longo da peça, indo os restantes actores interpretando de forma repartida um número plural de personagens. Tal opção, curiosa —e remota citação às «transformações» de Joseph Chaikin e do seu Open Theater—, acentua um ritmo frenético na narrativa, enfatizando ao mesmo tempo o efeito
brechtiano de «distanciação» no espectador. Igualmente merecedor de comentário, positivo, é a metamorfose do elemento central, a carroça da Mãe Coragem, numa estrutura híbrida e múltipla, centrifugadora física da acção. Em contraponto, negativo, a pobre utilização dos tão anunciados
elementos multimédia revela-se pouco criativa, banal e despropositada. Para concluir, duas observações finais: a tradução de algum vocabulário vernacular em calão «moderno», desajustado, e a composição excessivamente ridícula das personagens de Eilif e do Capelão, (com wakawaka à mistura), pareceram-me inapropriadas e reveladoras das decisões e interpretações estéticas do encenador. É uma questão de gosto, acrescente-se, e como se costuma dizer
gostos não se discutem.