o seu duplo perene
Com uma mulher como Gene Tierney (1920-1991) percebe-se o fascínio de Dana Andrews por Laura no filme de Otto Preminger. A leve obsessão [sexual] causada pela sua imagem num quadro na parede e por diversos relatos de terceiros, julgando Andrews que ela morrera, produziu um sentimento bizarro — que outra coisa poderá ser a atracção por uma mulher morta? — que valeu ao filme de Preminger a fama de o noir mais mórbido do cinema. Um abuso, sem dúvida. Andrews, ou o detective McPherson que este desempenhava, era apenas um homem e como tal «sensível» (se é que este adjectivo pode ser utilizado no masculino, perguntar-se-ão algumas mulheres) à meta-beleza feminina exposta. Note-se que nos dias de hoje o efeito é exactamente o mesmo: Gene Tierney está morta — contra factos não há argumentos — mas a sua presença perdura e provoca. Em imagens estáticas ou em movimento; em Cinema ou em Fotografia. O seu duplo perene, como descreveu Barthes. Ou a apoteose da concretização figurativa da mulher-objecto.